Aquela era uma bela tarde. Eu estava apressada, mas mesmo assim resolvi passar pela fonte perto de casa, era um lugar que sempre me trazia paz. Chegando lá, bebi um pouco daquela água pura que vinha da nascente. Olhei o relógio e percebi que estava uma hora adiantada, estava tão apressada que nem olhei direito que horas eram, mas isso significava que ainda era cedo para ir à escola.
Então parei na fonte e fiquei pensando nas coisas que vinham me passando pela cabeça naqueles dias. E eram muitas coisas, desde minhas “auto - decepções” até minhas mais idiotas ilusões. Uma senhora passava por ali, e quando ela se aproximou da fonte eu ajudei-a a coletar um pouco de água. Enquanto eu continuava divagando e ao mesmo tempo ajudando aquela senhora nem percebi que ele havia chegado.
E ele estava tão lindo quanto eu sabia que ele era. Cumprimentamo-nos, e enquanto eu auxiliava a senhora, fiquei pensando em como minha relação com ele era supérflua. Se um dia tivemos uma amizade mais profunda eu nem lembrava.
Enquanto a senhora ia embora, eu sorria. E ainda sorrindo, percebi que ele me observava. Meu olhar se cruzou com o dele, e senti que entre nossos olhares cruzou um sentimento. O tipo de coisa que só vemos em filmes e novelas. E naquele instante, eu tive a impressão de que ele me desejava tanto quanto eu o desejava.
Conversamos sobre assuntos triviais, do nosso cotidiano. Sinceramente, mal me lembro do que falamos. Mas lembro de cada uma das suas expressões. E aquele sentimento que ocorreu com aquele olhar, não era minha imaginação. Soube disso quando percebi que esse sentimento crescia durante a conversa. Então nos beijamos.
Esse beijo foi inesperado, apesar de eu esperar por ele á algum tempo. Era um beijo diferente, devagar, quente, aliás, tudo nele era quente. Era um beijo bom, melhor do que os outros poucos que eu havia experimentado.
Então seu celular tocou. Falou com certa indiferença com a pessoa do outro lado da linha. Disse que já a esperava. Pensei que não seria ninguém tão importante, ele pouco se importou ao que parecia. Mais alguns beijos aconteceram. E no meio de outra conversa nossa, eu ouvi passos.
Olhei para trás e vi uma garota aproximando-se. Num instante entendi tudo. Mas a verdade é que não me importei com ela. Foi a mesma sensação que as amantes devem ter quando veem a esposa do seu amado. Sem surpresa nem choque algum. Mas eu sabia que ela não era sua namorada, se ele tivesse uma eu saberia. Ela era só “mais uma”, afinal eu não era a única naquele lugar que podia ver como ele era lindo. Nesse instante, tive medo de também ser só mais uma. Perguntei-lhe se eu deveria ser discreta quando ela se aproximasse. Ele simplesmente fez que não com a cabeça como se isso não importasse. Tentei disfarçar assim mesmo, mas acho que não funcionou bem.
A garota se aproximou, eu a conhecia, já fizera parte da roda de amigas da minha irmã, e eu nunca pude imaginar eles dois. Ela estava exageradamente maquiada e bem arrumada. Fuzilou-me com os olhos. Fuzilou-o mais ainda. Perguntou-lhe como ele era capaz de fazer isso com ela. Impus-me, disse que estava sendo idiota de imaginar qualquer coisa entre nós, pois éramos amigos há anos. Ela não deu importância. Insultou-o e saiu a passos largos.
Ele não pareceu preocupado com ela, só pensou tê-la magoado e isso era ruim. Pedi-lhe desculpas por ter lhe causado essa situação. Ele deitou-se no banco e disse que não, que eu não tinha que pedir desculpas. Senti-me mal mesmo assim. Ele me fez sentir como se eu fosse especial para ele. Mas há algum tempo eu estava cansada de ilusões. Preferi acreditar no seu sentimento apenas naquele instante. Deu-me um último beijo que foi forte e pareceu sofrido. Como se se despedisse.
Naquele dia, fui à escola sem nenhum atraso. Porém fiquei pensando em como aquele dia iria influenciar nossa amizade. Sabia que se isso não desencadeasse num romance, simplesmente nos afastaria. Era praticamente impossível continuar uma amizade após aquilo. E uma amizade me faria desejar mais dele, o que não daria certo.
Então fiquei desanimada, querendo mais daqueles beijos, daquele corpo quente. Daquele jeito que só ele tinha e que eu sempre lembraria. Talvez eu voltasse àquela fonte todos os dias, ou talvez eu nunca mais quisesse passar perto. Mas isso eu só saberia com o tempo, e sinceramente eu sempre preferi os finais felizes.